Propor endurecimento penal como solução para o gravíssimo problema da insegurança, sem antes equacionar o problema prisional, “é pura e simples demagogia” (e eu acrescentaria: populista).
LUIZ FLÁVIO GOMES, jurista,
diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e coeditor do portal
atualidadesdodireito.com.br. Estou noblogdolfg.com.br
Editorial do jornal O Estado de S. Paulo
(01.05.13, p. A3) fez duras críticas à proposta do governador Geraldo
Alckmin de alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no
sentido de aumentar o tempo de internação dos menores que praticam
crimes violentos (hoje limitado a três anos). De fato, a legislação
brasileira, nesse ponto, é uma das mais liberais do mundo, mas em um
momento de “comoção pública intensa”, o que se deve esperar dos
governantes responsáveis “é serenidade para resistir às propostas
demagógicas populistas, que oferecem soluções mágicas que agravam em
lugar de resolverem o problema” (veja nosso livro Populismo penal midiático, Saraiva: 2013).
O governador, diz o editorial, “cedeu à
tentação do discurso fácil e, no embalo da emoção que ora contamina a
reação popular a esses terríveis episódios, tenta auferir algum ganho
eleitoral”. Aproveitou o “clamor popular” para desfechar uma cruzada em
favor do endurecimento da lei penal, com a promessa de que isso resolve o
problema.
Não temos que apoiar ou ficar
indiferentes a esses macabros atos de violência praticados por alguns
menores, mas o governador “não podia propor, demagogicamente, o que ele
não tem condições de cumprir”, ou seja, as instituições que abrigam
menores não contam com nenhuma vaga mais (as 8 mil disponíveis já estão
sendo ocupadas por mais de 9 mil menores). O sistema penitenciário
paulista, também falido, está com déficit de mais de 80 mil vagas. O
índice de reincidência é altíssimo, o que evidencia que tais
instituições não funcionam adequadamente. E ainda existem 18 mil
mandados de prisão por cumprir, no estado.
Propor endurecimento penal como solução
para o gravíssimo problema da insegurança, sem antes equacionar o
problema prisional, “é pura e simples demagogia” (e eu acrescentaria:
populista). A ONU vem dizendo que uma das políticas públicas mais
irresponsáveis da América Latina é a do populismo penal, porque promete
soluções mágicas para problemas muito sérios, iludindo a população com
medidas sedativas da sua ira e do seu profundo sentimento de impotência.
O legislador brasileiro, diante do
problema da criminalidade, desde 1940, não faz outra coisa que aumentar o
rigor dos castigos penais. O que conseguiu com isso? Em 1980, tínhamos
11,7 mortos para cada 100 mil pessoas. Em 2010, fechamos com 27,4 para a
mesma quantidade de habitantes. Passamos a ser o 18º país mais violento
do mudo. Ou seja: a política populista punitiva não é solução. Trata-se
de verdadeiro charlatanismo discursar em sentido contrário.
Mas a falácia de que a repressão é a
solução continua em voga. Enquanto não experimentarmos nossa emancipação
moral e aprendermos aproveitar os bons momentos econômicos (como este
que estamos vivendo – 7ª economia mundial) para lutarmos por educação de
qualidade nas escolas, nenhuma evolução significativa (do país como um
todo) podemos esperar. Sem educação nas escolas, efetiva e intensa (dos 6
aos 17 anos, das 8 às 18h, diariamente), só estaremos preparando nossos
jovens nas ruas para o aumento da produção da nossa fábrica de carnes e
ossos regados a sangue.
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