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Advogado e contabilista em Jaguariúna, SP. Sócio convidado da ACRIMESP - Associação dos Advogados Criminalistas do Estado de São Paulo, desde 11 de agosto de 1997, título de cidadão jaguariunense pelo Decreto Legislativo 121/1997 e membro titular do CONPHAAJ - Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico de Jaguariúna, nos biênios 2011 a 2012 e 2017 a 2018,

terça-feira, 3 de maio de 2011

Do Estado de direito ao estado marginal


Luiz Flávio Gomes - 03/05/2011

Estado de direito é o estado regido por regras jurídicas coercitivas (dotadas de força, consoante Derrida). É o Estado limitado pelo próprio direito, o que não pode cometer abusos ou excessos impunemente. Estado de exceção, no plano constitucional, é o que permite a suspensão da eficácia de algumas regras gerais (a suspensão da força delas), para se submeter a um regramento jurídico específico, típico de uma situação anormal. Trata-se de uma segunda força, que substitui a primeira.

No estado de exceção as normas jurídicas do Estado de direito continuam vigentes, porém, sem eficácia prática, sem força (momentânea), ou seja, são suspensas para dar lugar a uma nova ordem jurídica, de exceção, de emergência. Os direitos e garantias fundamentais do Estado de direito, durante o estado de exceção, ficam suspensos (ficam sem força).

O terceiro estágio existente é o do estado marginal, que corre às margens do Estado de direito, à margem dos direitos e garantias fundamentais. O estado marginal é uma práxis total ou grandemente fora do direito. Não se confunde com o Estado de exceção porque não é declarado formalmente.

No estado marginal a força (violência) acontece fora ou à margem do direito. É um tipo de estado paralelo, regido pela força bruta, pelo voluntarismo dos agentes públicos, especialmente dos encarregados da repressão.

A prática político-criminal afastada das regras limitativas do Estado de direito constitui a essência do estado marginal. Tudo é feito em nome de um direito “maior”, direito à segurança, à tranqüilidade, à paz. A sociedade vê, em geral, com bons olhos essa defesa social. Busca-se a paz por meio da guerra (por meio da força bruta, da violência). Eficientismo é o valor reinante, ainda que pagando preço alto (consistente na flagrante violação da ordem jurídica).

Os abusos cometidos pelos agentes da repressão (busca pessoal em mulher feita por homens, disparos à queima-roupa dos jovens negros de todos os rincões – o Brasil é o campeão do mundo em assassinatos de jovens – etc.) são tolerados ou ficam impunes. Existe uma força (oculta) que ampara todas essas ilegalidades (muitas delas praticadas pelos juízes). O discurso populista autoritário sempre encontra adeptos, sobretudo quando bem explorado pela mídia.

A impunidade é a grande companheira do estado marginal, que não teria o sucesso que tem sem o apoio (velado ou ostensivo) de grande parcela da população, de atores políticos, da mídia, de legisladores e de atores jurídicos.

No Brasil sempre existiu o paralelismo do estado marginal. Aqui os portugueses chegaram praticando genocídio contra os índios. Em 1822 foi instituído oficialmente o Estado de Direito brasileiro, que nunca vigorou isolado, soberano, absoluto. Um país fundado na discriminação étnica e socioeconômica necessita (compulsoriamente) de margens extraoficiais de forças para sua atuação em nome da segurança, do bem-estar geral.

Os direitos e garantias (tirando períodos declaradamente ditatoriais) sempre estiveram vigentes, porém, com força limitada, porque sempre tiveram que conviver com a força marginal das práticas político-criminais aniquiladoras, expulsivas, torturantes, mortíferas (é só olhar o que está acontecendo nos nossos presídios para se entender o que é o estado marginal). 

Luiz Flávio Gomes é mestre em direito penal pela USP e doutor em direito penal pela Universidade Complutense de Madrid. Foi promotor de Justiça em São Paulo de 1980 a 1983 e juiz de direito em São Paulo de 1983 a 1998. É professor honorário da Faculdade de Direito da Universidad Católica de Santa Maria (Arequipa, Peru) e professor de vários cursos de pós-graduação, dentre eles o da Facultad de Derecho de la Universidad Austral (Buenos Aires, Argentina) e o da Unisul (SC). É consultor do Iceps (International Center of Economic Penal Studies), em New York, e membro da Association Internationale de Droit Penal (Pau-França). É diretor-presidente da Rede LFG (Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes), que promove cursos telepresenciais com transmissão ao vivo e em tempo real para todo país.

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